Afinal, o que é infidelidade?

por Clara Pladê

Eu estava lendo uma revista, na qual havia uma entrevista com Paulo Coelho – escritor que eu particularmente não gosto – dentre meia dúzia de idéias intencionalmente polemicas, o escritor exprimiu uma curiosa, segundo ele: não existe fidelidade de corpo, existe fidelidade de coração. Visto pelo lado do ser humano como animal, ele pode estar certo.

Analisando o fato de antes de sermos seres humanos, produtos de uma sociedade cheia de valores morais e éticos, somos animais, com total instinto e alguma razão (esse último fator é o que dizem nos fazer superiores aos demais animais, coisa que eu tenho lá minhas dúvidas), é fácil e lógico se concluir que o corpo é apenas um instrumento de nossas vontades, um instrumento que com o tempo se desgasta e morre. Então é certo pensar que prova de amor é dar total e exclusiva posse do tão frágil corpo a uma só pessoa?

Raul Seixas tocou no âmago desse assunto quando cantou que “… um amor a dois profana o amor de todos os mortais, porque quem gosta de maçã irá gostar de todas, porque todas são iguais…”, também não gosto de Raul, mas assumo que vejo alguma lógica – quiçá toda – em seus versos na música A Maçã. O amor é algo superior ao corpo, tal superioridade é provada com a impossibilidade que todos têm na tentativa de descrever exatamente tal sentimento, porque quem o conhece de verdade, não sabe explicar, apenas sentir. Quem ama de verdade ama de alma para alma, o corpo é apenas um acessório utilizado na materialização do amor.

Entretanto, essa separação de amor e sexo é uma questão quase que exclusivamente masculina. Todos os homens pensam assim, sabem perfeitamente separar o corpo do coração e não são julgados por isso. Penso que a mulher, lá no fundo, também saiba, pois antes de ser mulher, é animal como o homem, possuindo assim os mesmos instintos, não demonstrados apenas por imposições desiguais da sociedade. Cada pessoa quer o privilégio só para si, nesse caso, principalmente a ala masculina. Em uma mesa de bar, se um homem expressar tal idéia de que não existe fidelidade do corpo, todos os outros homens concordarão, mas se for uma mulher que disser isso para seu parceiro, ele achará o ápice do absurdo. Eles podem, eles têm o direito, apenas eles têm prerrogativa da irracionalidade quando querem, e é aí, exatamente nesse ponto, que percebo o erro de tal pensamento ultrajante. Mas não estou aqui para levantar a bandeira feminista.

Se uma pessoa pensa dessa forma tão liberal, o ideal seria expor isso para o outro, mas a covardia humana fala mais alto. O que falta para esse pensamento sobre fidelidade, característico do estado de natureza humana, ser primoroso, é, simplesmente, ser aceito por todos e para todos. O pior em uma traição não é saber que outra pessoa tocou o corpo daquele que você julgava ser seu, o que dói mesmo é a consciência de ter sido enganado.

Não é justo achar que por ser fiel de coração a só uma pessoa, pode entregar seu corpo a outras, quando o parceiro pensa que fidelidade é um conjunto de exclusividades sentimentais e corpóreas. Não é justo que pense assim e não deixe o outro pensar. A partir do momento em que engana, a pessoa está provando que o egoísmo dela é tamanho, a ponto de preferir mentir a deixar o parceiro ter a mesma liberdade. Pensamentos insultuosos são lindos, mas que haja uma reciprocidade, senão ficam covardes, egoístas e imorais.

Published in: on agosto 29, 2008 at 4:47 pm  Comments (2)  

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2 ComentáriosDeixe um comentário

  1. Rpz, não vou comentar minha opnião porque não gosto de falar disso, e você sabe.
    Mas o texto ta muito bom, tanto que você me fez ler uma coisa que não gosto. Até eu quando terminei fiquei surpreso, isso ai. Bons argumentos, e bem trabalhado.

    Very good…

    XD

    beijo

  2. ado-rei o layout e o texto.
    como ja havia comentado entre outras coisas, a respeito, sao corajosas as pessoas que abordam assuntos tao polemicos como infidelidade, sexismo etc e tal…
    seus argumentos estão muito bem fundamentados e o que vc falou sobre nao citar conhecidos que concorde contigo pq achas que deves articular sozinha; “de pessoa comum para comuns” é algo que também admiro e inclusive, fiquei emputecida quando fui O-BRI-GA-DA a citar um sexólogo em meu texto sobre as prostitutas ><‘ MAAAS, um dia pessoas serão obrigadas a ME citar.
    deixa estar ki tô chegando.


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